domingo, 17 de maio de 2009

Deus Decepção

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DEUS DECEPÇÃO

Eu, cheio de preconceitos, racista!
Eu, com falsos conceitos, neo-nazista!
Eu, detestando pretos.

Eu, sem coração.
Eu, perdido num coreto Gritando: - Separação!
Eu, você, nós...

Nós todos Cheios de preconceitos,
Fugindo como se eles
Carregassem lodo.

Lodo na cor... e com petulância, arrogância
Afastando a pele irmã...mas...
Estou pensando agora
E quando chegar a minha hora ???
Meu Deus, se eu morresse amanhã
De manhã???
Numa viagem esquisita
Entre nuvens feias e bonitas
Se eu chegasse lá?
E o porteiro manco
Como os aleijados que eu gozei
Viesse abrir a porta
E eu reparasse a vista torta
Igual aquela que eu critiquei
Se sua mão tateasse pelo trinco
Como as mãos do cego que eu não ajudei?

Se a porta rangesse
Chorando os choros que provoquei?
Se uma criança me tomasse a mão
Criança como aquela que não embalei?
E me levasse por um corredor florido, colorido,
Como as flores que eu jamais dei?

Se eu sentisse o chão frio
Como dos presídios que não visitei?
Se eu visse as paredes caindo
Como das creches e asilos que não ajudei?

E se a criança tirasse corpos do caminho
Corpos que não levantei
Dando desculpas que eram bêbados
Mas eram epiléticos
Que era vagabundagem
Mas era fome.

Meu Deus!
Agora me assusta pronunciar seu nome!
E se mais pra frente a criança
Cobrisse um corpo nu
Da prostituta que eu usei
Ou do moribundo que não olhei
Ou da velha que não respeitei
Ou da mãe que não amei...

Corpo de alguém exposto
Jogado por minha causa
Porque não estendi a mão
Porque no amor fiz pausa
E dei, sei lá, só dei desgosto.

E no fim do corredor
O início da decepção!
Que raiva, que desespero
Se visse o mecânico, o operário
Aquele vizinho, o maldito funcionário
E até o padeiro
Todos sorrindo não sei de que...
Ah! Sei sim, riem da minha decepção.

Deus não está vestido de ouro
Mas como???
Está num simples trono
Simples como não fui
Humilde como não sou
Deus decepção!

Deus na cor que eu não queria
Deus cara-a-cara, face-a-face
Sem aquela imponente classe
Deus simples!

Deus negro!
Deus negro!
E eu ... Racista!
E agora???
Na terra só persegui os pretos
Não aluguei casa, não apertei a mão
Meu Deus você é negro, que desilusão!

Será que vai me dar uma morada?
Será que vai apertar minha mão?
Que nada!
Meu Deus você é negro, que decepção!

Não dei emprego, virei o rosto
E agora?
Será que vai me dar um canto?
Vai me cobrir com seu manto?
Ou vai virar o rosto
No embalo da bofetada que eu dei???

Deus, eu não podia imaginar
Por que você se fez assim?
Por que se fez preto?
Preto como o engraxate
Aquele que expulsei de frente de casa
Deus, pregaram você na cruz
E você me pregou uma peça
Eu me esforcei à beça
Em tantas coisas, e cheguei
Até a pensar em amor
Mas nunca, nunca pensei
Em adivinhar sua cor!
(Neimar de Barros)

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