domingo, 13 de novembro de 2011

A Cadeira de Dona Bila

A Cadeira de Dona Bila
(Reynollds Augusto)


           Eu me considero um saudosista. As experiências do passado alimentam a nossa alma e reavivam a sensibilidade. É como se tivéssemos um filme interior, guardado do profundo da consciência, esperando que o “interruptor” da saudade acione a máquina da memória e nos ajude a repassar em revista as experiências emocionais vividas e que fizeram diferença nos nossos momentos. Um cheiro, uma paisagem, uma musica, um quadro, um momento, faz com que nós realizemos aquela regressão de memória, consciente, ao passado, que jamais se perde.

            É claro que as lembranças só valem quando energizam o nosso mundo íntimo. Nada de estar relembrando bobagens, guardando ressentimentos e trazendo ao presente - que é a verdadeira jóia- dor e sofrimento. Quando muito elas servem para que nós aprendamos a não mais repetir os mesmos erros. 

          Tem gente que está preso definitivamente ao passado e isso não é bom. Tem gente que não sabe perdoar o irmão e vive com um peso danado nas costas e segue pesaroso. Mas ao relembrarmos as experiências vividas, positivas, estamos trazendo estímulos para o nosso mundo íntimo. 

           Quando adolescente, o palco principal da minha vida, que não tem fim, foi a rua Pedro Américo, hoje Soares madruga. Foi lá que a molecada, em tempo de criança, fez as suas traquinagens e que são objeto das nossas mais lidimas e positivas lembranças. Era tanta criança que parecia um formigueiro se reunindo para brincar, “brigar”, se divertir, ser feliz. A geração de hoje não sabe o que é isso. O computador, a maior invenção desse tempo, não socializa as pessoas e esse negócio de só ter amigos virtuais é chato para “caramba”. Tem gente que só namora pelo computador. É o caos das relações. 

           De outra sorte, temos uma Biblioteca Mundial em nossa casa. O segredo é saber usar essa ferramenta, que veio para ficar.

            Naquela época, fazia parte desse palco as nossas vizinhas Fezinha e Dona Bila, que já partiram para a pátria espiritual. O quadro está vivo em minha memória. Mãe e filha única moravam juntas, uma dando sustentação à outra. Eram almas compromissadas e reencarnaram para juntas viverem a experiência de mãe e filha, cumprindo missão juntas, dividindo sentimentos e experiências.
             A “morte” levou fezinha cedo para a pátria espiritual, nossa próxima parada, para continuar, “andando”, nessa estrada da vida que, repito, não tem fim, rumo ao aperfeiçoamento pessoal até atingirmos a perfeição relativa. A sua morte causou uma tristeza geral, pois ficamos preocupados como Dona Bila iria seguir sozinha. 

              Não é interessante que uma mãe veja o filho morrer primeiro. Mas Deus sabe o que faz e ela sobreviveu bem e ainda conseguiu, por um longo tempo, cuidar de um filho tetraplégico, que veio morar consigo e lhe fazer companhia. Com a sua morte, o filho logo-logo partiu.
             Mas não é de bom tom ficar pensando nessa estrada que não tem fim. O nosso objetivo, de espíritos em evolução, esta tão longe que não é bom nem pensar nisso. O melhor e mais eficaz é viver um dia de cada vez, sem stress, ansiedades e tudo mais. Se você resolver viver um dia de cada vez e escolher ser feliz, apesar dos obstáculos, você viverá sempre e em estado de equilíbrio. Viverá bem a vida toda, um dia de cada vez.

            Não tenha pressa e apenas semeie o bem, pois a colheita, que é obrigatória, virá.
            Mas, Dona Bila, baixinha, dura, sempre puxava as orelhas dos “cãos” da Rua Pedro Américo. Tinha um coração enorme, mas não conseguia ficar em paz com aquela “quadrilha” de moleques. Fezinha, não ficava atrás e nós temíamos as suas reações. Os atores eram tantos que não dá para relembrar de todos, mas tinham uns que faziam “papéis” de protagonistas, que não se pode esquecer: O “Veizinho”, ou Juvianez, filho da saudosa Dona Alzira, que mora lá para as “bandas” de Patos; o Damião Guimarães, filho de Chico e Toinha Guimarães; o Laércio, filho da Lúcia e do Loreto; o Valmir Júnior, hoje professor universitário e Valquimario, seu irmão, e tantos outros protagonistas e atores secundários que movimentaram aquele tempo que jamais esquecermos e que estão espalhados por esse mundo de meu Deus.

               Lembrei-me de Vilaldo, o Ladim; Jean, seu irmão; Dielson, este morando em Brasília. Mas essa turma aí era a dos grandes lá de cima, que aproveitava a compleição física para bater e dar cascudos nos menos avantajados, os nanicos, que eram todos nós, da turma daqui de baixo, os verdadeiros “moleques”. Tinha cada um!

                Mas voltando às lembranças: Dona Bila tinha uma cadeira de balanços, talvez a melhor da rua: branca, espaçosa, revestida de fios seguros e que serviram de parque de diversão para a molecada. Era 19h00min horas de um desses anos da década de 80, talvez 1981 e Juvianez, o autor intelectual das traquinagens, convocou a turma para balançar no parque de todos nós.

              - “Nodinho”, a cadeira está vazia. Dona Bila deve estar lá dentro jantando. É agora.
                 E a molecada se aproximava da grande cadeira e ficava um sentado no seu centro, e outros dois nos apoios dos braços, nas laterais, que pareciam mais dois batentes. Não se faz mais cadeiras com antigamente. Por trás ficava um dos nossos, balançando a cadeira com velocidade e cantava uma bela música, para sonorizar o momento especial, imitando a velha difusora rouca dos parques de diversões, que vinham a Itaporanga.

- “onde estão seus olhos negros... onde estão seus olhos negros...”

               À Frente da residência havia três janelas grandes e escolhíamos um “olheiro” para acusar quando Dona Bila terminava de Jantar e ía lavar as louças. Dificilmente ela notava de logo, que estávamos nos divertindo no nosso parque, ou melhor, em sua cadeira. Quando isso acontecia, era um Deus nos acuda e a correria era geral.

- FEEEEZZINHA!!! Os moleques “cãos” da Pedro Américo já estão destruindo a minha cadeira de balanço, chama a polícia agora. Parece que não tem pais...

A correria era grande...

               Saudades de Fezinha, de Dona Bila, que se reencontraram na pátria espiritual, pois os amores não se perdem com a morte do corpo físico, quando muito dão um até logo. A vida é um interminável reencontro.


Relembre o seu passado. Isso te fará bem.


PENSE NISSO! MAS PENSE AGORA.

1 comentários:

Imagino, q o caro Rainério, editor imparcial, pode ate não postar o comentario . Mas certamente encaminhará ao autor. Pela grandeza que é o Rainério e toda sua linhagem.

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