(Onildo Sitonio)
Muitos anos se passaram, desde a última vez que Te vi, minha Bela!
Mas, ainda trago no mais recôndito do meu coração, no mais intimo do meu pensar aquela pontinha de alegria ao Te recordar, querida mãe da minha infância!
Poeirenta, quente, violenta, pobre –na minha pobreza par, e nobre, de uma nobreza sem par.
Assim Tu eras, vida minha, torrão materno, cápsula temporal no meu viver!
Na minha mente, como um raio retardado e longo, doce faceta da minha alma, estás presente, longeva pole, de resistência impar , de um fulgor assaz eterno.
Os teus filhos nunca te esquecem, e o teu solo, hoje recoberto pelo preto do asfalto, foi testemunha de tantos casos de amor por ti, de desamor pela vida , de conflitos destruidores , de extremos no tratar; de festas populares inesquecíveis, de façanhas inimagináveis, marcas que não sãofáceis de apagar!
Um processo semi paranormal que afetou, diretamente, o desenvolvimento psiquico e mental de toda uma geração de filhos teus.
Como em um novo velho filme, do cinema de Ivan e Luzia, passamimagens indeléveis, ocasiões impares, lembranças vivas dos fatos e lugares que marcaram os nossos primeiros anos de vida.
Misericórdia!
Como tu eras linda e aconchegante!
Como nós passeávamos sobre o teu corpo desnudo e quente, mesmo nas noites frias e desertas dos teus pequenos invernos; como éramos felizes na nossa pequenez de crianças e adolescentes, curtindo o vai e vem das moçoilas em frente a sorveteria de Firmino, a difusora de Ananias a mandar páginas melódicas oferecidas a qualquer fulano, ponto mais que obrigatório das paqueras e dos flertes , onde eu conheci o meu primeiro amor, aquele morenaço, a deusa que povoou o meus sonhos por infindáveis noites; e nós, meninos, sôfregos por um olhar comprometedor, ficávamos a espreita de uma fugaz olhadela dela, da musa, da escolhida, da princesa , que as vezes nem essas coroastodas possuía.
Inúmeras tardes, passamos a tomar meiotas e jogar conversa fora no bar de Evilásio!
Ah!, as noites na praça do obelisco, quando nos juntávamos., à luz da lua, muitas vezes, para os campeonatos de pum e cuspo à distância – Bal, Nego Nilton, Zé Pibita... as intermináveis lutas de mocinho e bandido, por entre as madeiras ao largo da praça, na velha e talvez a única madeireira, que servia de perfeito esconderijo às nossas brincadeiras de cowboy, inspiradas nas mais recentes fitas do grande e inocente Roque Lane.
Ah!, as noites prateadas passando anel, sentados na calçada de Sebastião Gomes, brincando de boquinha de forno...forno... se eu mandar...vou...., a meninada toda da rua 05 de agosto, as mães enfileiradas catando piolho nos rebentos umas das outras, e cantarolando canções em uníssono; os candeeiros acesos nas janelas, prontos para serem derrubados por Pililiu de Iaiá eCarlinhos de Chico Lopes, os dois maiores e conhecidos bandoleiros da gurizada.
Os seus verões sertanejos quentíssimos, o sol a pino , o horizonte tremendo de calor, os banhos refrescantes no rio Piancó, o poço de Trocate, a caixa dágua, os carrinhos cheios de marcela, que carregávamos na beira da lagoa, os cavalinhos de pau, roliços e verdinhos, o aveloz da roça de ..., o Grupo Escolar onde fazíamos as mais loucas estrepolias, os esconderijos do Cruzeiro- onde brincávamos de camam, a famosa roça de Nesson, as noites e mais noites que ficávamos às portas do Atlântida, esperando dar a hora para entrar de graça nas festas que nós não podíamos pagar, as noites frias e desertas das madrugadas com o vento assobiando sobre nossas cabeças.
Quanta aventura!
Lembro sempre de Ti, minha aurora !
Enumerar lembranças, quando a memória já anda um pouco fraca, é uma missão quase impossível, mas, o coração comanda o cérebro quando falamos de amar, de extravasar sentimentos remotos.
Repuxo o tempo, quando à minha mente vislumbro a Praça da Matriz, a própria, o grande e querido Padre Zé, o sacristão Irineu, sempre douto a tocar o sino repicado, a beataria, o escurinho de ¨atrás da Igreja¨, onde era bom para namorar, as festas da Padroeira, Nossa Senhora da Conceição, festa mesmo de encardir, as meninas que iam para lá e para cá, ao redor da praça, com seus vestidos lindos e seus sorrisos encantadoramente atrativos. Ah!, as meninas...
O grande Bosco, locutor da pesada – quando vier a Itaporanga, visite o bar e restuarante são francisco -, inesquecível voz dos auto falantes diurnos e noturnos estendidos ao longo da Avenida Getulio Vargas!
Como era bom ser teu filho querido, Pedra Bonita!
Como era gratificante voltar sempre para Ti!
Conhecer-te, quando eras ainda jovem e promissora, a Rainha do Vale do Piancó, era um deslumbre total.
Explorar todos os teus recantos, encantos e desencantos, teus lugares sacros ou devassos, tuas novenas intermináveis de louvor a Nossa Senhora, ou curtir teus assustados no Acrei, onde podíamos dançar coladinhos as músicas de R. Carlos, Jerry Adriani..., falando baixinho ao ouvido coisas da nossa malandragem adolescente, fumando cigarro Holywood e tomando cachaça com limão e coca, limão e nada.
Eu ainda assisto na memória, minha tentadora paixão, as fugas espetaculares dos casais apaixonados e proibidos de casar, as rusgas familiares dos Herculano e dos Sinfrônio, a Andorinha de Seu João, a Gaivota de João Moco, o homossexualismo rudimentar de Duda e Giboião, jegue-preto, com sua endêmica loucura, besouro, cadê os bobes?, levanta a saia da mãe... , os impolutos Dr Praxedes e Dr Balduino, as polêmicas tardes-noites protagonizadas por João Dehon, a figuta ilustre de Zé Barros, do cartório, o Ginásio, majestoso, na colina do cemitério, o Mercado Municipal e o Colégio, feito por meu pai, onde nós nunca pudemos estudar. (Sinceramente, um grande e inapagável erro pedagógico e espontâneo!)
A memória vai desvanecendo...
Hoje, as notícias que recebo sobre Ti, não me animam a te visitar!
Perdeste a tua inocência, ficaste adulta demais para reiniciarmos um relacionamento, te encheste de vícios e viciados, a televisão te corrompeu, teus meninos já não são mais os mesmos, teus casais não têm mais o lirismo de outrora, já não é proibido namorar, a internet acabou os passeios e os flertes, e os teus rapazes e moças se escondem nos lençóis dos motéis para se declarar.
Trocaram as meiotas de cachaça pelas guimbas de maconha e os picos de cocaína!
Os nossos guris estão morrendo à toa!
Mas, minha bela, não fica amarga e triste.
Não estás só nessa lamúria humana, neste abominável desperdício de vidas e histórias.
Aqui, onde estou a retirar do fundo do meu baú, as coisas acontecem em proporção.
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