Edmilson Lucena
Vivemos em meio à riqueza. O padrão de vida de qualquer pessoa que esteja inserida na nossa sociedade, mesmo que viva em uma favela, é muitíssimo superior ao dos reis da França de antanho. Há mendigos que são obesos mórbidos! O mínimo indispensável para a sobrevivência (abrigo, roupa, água e comida) está praticamente garantido para qualquer citadino.
Dispensada, assim, dos esforços que ocupavam as gerações anteriores, a população pode se entregar aos maus hábitos que sempre marcaram as classes superiores de uma sociedade decadente: luxúria, gula, cobiça...
Nos supermercados, encontramos aquelas revistas que sempre trazem na capa uma receita de doce hipercalórico e uma dieta miraculosa. Na mídia, o assunto principal parece ser sempre sexo: Fulano tirou fotos nu, Beltrano fez declarações sobre seus desejos sexuais por periquitos depenados, Sicrana foi vista trocando beijos, e por aí vai.
Ao mesmo tempo, a propaganda está sempre oferecendo um novo objeto de cobiça: o celular do momento, o carro ainda mais novo, o banco que empresta dinheiro para consumir mais e mais.
São pulsões básicas e desordenadas, que tomam a frente nos interesses e deixam o cuidado da sociedade ao encargo de aventureiros. A CPI do momento passa por noticiário político, enquanto a população se dedica a palpitantes notícias sobre qual pintinho vai ou quer ir para qual buraquinho. É um tipo de pseudonotícia que só desperta interesse por ser uma forma de projeção dos próprios desejos, e sua onipresença acaba levando a que se confunda o desejo, que é algo de foro íntimo, com a própria identidade social.
Daí termos uma presença crescente de quem se defina a partir do uso que faz ou quer fazer de pintinhos e buraquinhos; daí termos uma demanda crescente por meios de esconder e sufocar as consequências físicas e psicológicas desta fixação – do aborto aos remédios de tarja preta, passando pela contracepção e pela distribuição de camisinhas –; daí termos, em suma, uma sociedade que tenta ser, ela toda, uma versão industrializada e embalada a vácuo da triste elite da Roma decadente.
Enquanto isso, o analfabetismo grassa mesmo entre os universitários; a boa música, por demandar esforço, é substituída por um “batidão” pré-gravado; e novos recordes de endividamento pessoal surgem a cada dia. O sucesso do crack – já semilegal, por não dar cadeia – vem justamente de ele ser a forma química desta visão de mundo centrada no prazer. Sabe Deus o que vão reivindicar como “direito humano” daqui a uns meses.
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