O MAR
(Laura Pereira)
“Foi assim, como ver o mar, a primeira vez…”.
A canção romântica do “14 Bis” nos fala do inescapável destino que une duas almas em um amor que chega e fica para sempre. A canção cala fundo na alma, mas nada se compara à sensação que se tem quando alguém deseja, ansiosamente, conhecer o MAR.
Era mais do que um sonho, uma conquista! Nos verdes anos de menina, olhava o céu do sertão imensamente azul e inventava o mar… ele devia ser como o espaço, infinito na minha imaginação. Os mais velhos diziam que o mar era realmente infinito, pois não dava pra ver onde acabava e eu, claro, criava mil situações, me fazia centenas de perguntas… A verdade é que desejava desmedidamente ver o mar, pois nunca tinha ido ao seu encontro. Queria vê-lo, senti-lo, brincar nas suas águas… e eis que um dia surgiu a oportunidade de finalmente realizar o meu sonho, finalmente.
Minha mãe viajaria para o litoral, mas não fazia planos de me levar com ela, então foi aquele chororô… chorei a noite toda, inconformada, como se aquela fosse a única e última vez que teria pra ver o mar, não podia ser de outro jeito, tinha que ser daquela vez. Insensível ao meu pranto, minha mãe continuava irredutível, não me restava nada além de chorar, chorar e chorar… e chorei com vontade, vontade de ver o mar.
No outro dia estava na estrada, a caminho de realizar o meu sonho… que maravilha! Fomos cedinho, o sol mal tinha nascido. O que senti, naquele momento, não dá pra falar… foi um misto de medo, de espanto, de encanto… Lá estava ele, infinito aos meus olhos, como diziam os mais velhos. Tive vontade de correr ao seu encontro, mas tive medo, fiquei por instantes, mergulhada num estupor jamais experimentado… quanta emoção por tão pouca aventura…
Hoje, quanto me lembro daqueles instantes, rio da minha ingenuidade de criança, da expressão divertida que vi no rosto da minha mãe a me ver com medo e com vontade de me “aventurar” mar adentro. Fico imaginando se algum dia na vida sentirei algo tão marcante, tão emocionante e ao mesmo tempo tão medonho como a primeira vez que vi o mar, que senti nos pezinhos a areia fofa e a água fria que me tocou.
Será que algum dia aconteceria algo capaz de me surpreender daquela maneira? Passaram-se os anos e outras impressões foram marcando a minha vida. Apaixonei-me, casei e até experimentei sensações parecidas com aquelas do mar (a primeira vez). Elas apareceram quando fui mãe pela primeira vez, mas foi de maneira diferente, fiquei embevecida de tanto amor, um amor divino, doce, diferente daquele outro que metia medo e encanto.
Depois do nascimento das minhas filhas o mundo se tornou evidente demais, uma alegria aqui, uma tristeza acolá, nada que me chamasse à atenção daquela maneira, nada que fizesse com que eu me surpreendesse com o mundo, nenhuma novidade fora de série, eu estava mergulhada na rotina, no cotidiano cruel que não surpreende… e pensar que algo tão simples como ver o mar tivesse marcado profundamente a minha alma…
Voltei várias vezes àquele lugar, o mar continua belo e carrega os seus encantos, me lembrei de todas as histórias de sereias, de cidades submarinas que me contaram… No entanto, o mar não mais me surpreende, porém transmite uma paz indizível, uma integração perfeita com o infinito, sensações diferentes daquelas que senti no passado, mas sensações que ainda mexem comigo… um quê de magia que me encanta e me mata de saudade quando estou longe… Queria terminar meus dias perto do mar, caminhando em suas areias, sentindo o vento acariciar o meu rosto e emaranhar os meus cabelos. Queria me surpreender novamente com uma emoção forte, forte o bastante para deliciosamente de desestruturar e me montar de novo…
Quem sabe não voltarei a senti-la quando da passagem desta vida para outra? Verei novamente o desconhecido e experimentarei emoções diferentes, nesse momento eu sei que aquela cena perdida no passado retornará com mais intensidade e como uma criança que, depois de chorar desesperadamente para ver o mar, finalmente acaba por encontrá-lo.
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