domingo, 17 de fevereiro de 2013

Saudades do Exílio (II)

A cada dia que passa a gente vai aprendendo belas e alentadoras lições de vida através da boa leitura. Foi o que aprendi recentemente com o Doutor Dráuzio Varela, humanista antes de tudo, não apenas no exercício da Medicina, solidário que sempre tem sido com as camadas sociais mais humildes do nosso povo, mas também como renomado escritor, uma dezena de obras nas melhores livrarias do nosso país e do exterior, traduzidas a vários idiomas: “O homem é o conjunto dos acontecimentos armazenados em sua memória e daqueles que relegou ao esquecimento”. Exulto e sublinho tal assertiva no livro Carcereiros, obra que recomendo, editada pela Companhia das Letras.

Ainda estou no México onde conheci outros exilados brasileiros e reencontrei colegas das forças armadas, Exército, Marinha e Aeronáutica –em similares condições, além de muitos civis homens e mulheres, vítimas da feroz repressão golpista.

O padre Francisco Lage já velhinho, cabelos brancos nevados pelo tempo, de vez em quando usava a bengala para celebrar missas na paróquia proletária do bairro de Monctezuma. Carpia seu desterro porque defendera o governo deposto do presidente João Goulart. Como senão bastasse a ousadia de defender “aquele comunista“ nas Minas Gerais de Magalhães Pinto et caterva – coronéis Olímpio Mourão Filho, Carlos Luiz Quedes e o velho José Bragança, vinculara-se a Francisco Julião incentivando as Ligas Camponesas na luta pela reforma agraria, na Lei ou na marra como se dizia então.

Certa feita, entusiasmado, convidou-nos (a mim), Raimundo Correia de Oliveira (já falecido) Adelzito Bezerra e Edilton Zandavale Suarowski todos ex-marinheiros à exceção do pernambucano RCO a quem mais tarde identificaríamos como informante do Cenimar – Centro de Informações da Marinha - , a acompanhá-lo na visita festiva aos seus paroquianos. Já conhecendo a Tequila notei que padre Lage, discretamente, gole a gole, provava daquela bebida sem exagerar.

- Meus filhos ... não se embriaguem – aconselhava sorrindo, sua pele gringa ( parecia um alemão) avermelhava.

Foi naquela noite que conheci Irma Álvarez, funcionária pública em Cuernavaca onde vivia o companheiro Francisco Julião. Uma coisa puxava a outra. E deu no que deu: namoro à primeira vista.

Foi assim que tentei esquecer Ritinha, minha noiva carioca, agora decepcionado com as cobranças constantes da Bemoreira em cuja loja de Cascadura fizera-me devedor de móveis, geladeira, cama e colchão, e outros bens duráveis inclusive algumas ações que comprara naquela grande empresa tudo mais tarde confiscado por minha inadimplência. Em consequência, cai no fundo do poço, meu nome enlameado sem crédito na praça, muito menos ainda com minha ex-futura sogra Darcília praticante fervorosa do Espiritismo a comentar com a vizinhança de Vaz Lobo e adjacências que só podia dar naquilo, “o noivo da minha filha enrolado com os comunistas”.

Ritinha escrevia-me chorando colocando –me a par de tudo, frustrada com tamanha desilusão. Meses depois se casaria com um italiano com o qual teria um filho e logo viria o divórcio no mar revolto de desencontros sentimentais. Anos depois minha ex noiva Ritinha se casaria com um também viúvo Major reformado do Exército Brasileiro, passando a morar em Copacabana. Através de amiga comum, desejei-lhe muita saúde, paz e felicidades. Na minha graduação de Marinheiro de gola jamais tivera as condições de um oficial superior do Exército em termos materiais.

A mexicana Irma Álvarez me consolava e eu fazia o possível para esquecer Ritinha. A cada dia a chama do meu amor por ela foi esfriando até apagar-se para sempre da minha memória.

Eu amava Irma Álvarez......

0 comentários:

Postar um comentário