Por Ana Lu
Este texto está dentro do contexto do que acontece em Itaporanga:
“Na primeira noite eles se aproximam, roubam uma flor de nosso jardim. E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem: pisam nas flores, matam nosso cão, e não dizemos nada.
Até que um dia, o mais frágil, deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz, e conhecendo o nosso medo, arrancam-nos a voz da garganta. E já não dizemos nada“
(Eduardo Alves da Costa, No caminho com Maiakovski)
Eduardo Alves da Costa*
Assim como a criança
humildemente afagaa imagem do herói,
assim me aproximo de ti, Maiakóvski.
Não importa o que me possa acontecer
por andar ombro a ombro
com um poeta soviético.
Lendo teus versos,aprendi a ter coragem.
Tu sabes,
conheces melhor do que eu
a velha história.
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na Segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.
Nos dias que correm
a ninguém é dado
repousar a cabeça
alheia ao terror.
Os humildes baixam a cerviz;
e nós, que não temos pacto algum
com os senhores do mundo,
por temor nos calamos.
No silêncio de meu quarto
a ousadia me afogueia as faces
e eu fantasio um levante;
mas amanhã,
diante do juiz,
talvez meus lábios
calem a verdade
como um foco de germes
capaz de me destruir.
e o que vejoe acabo por repetir
são mentiras.
Mal sabe a criança dizer mãe
e a propaganda lhe destrói a consciência.
A mim, quase me arrasta
pela gola do paletó
à porta do temploe me pedem que aguarde
até que a Democracia
se digne a aparecer no balcão.
Mas eu sei,
porque não estou amedrontado
a ponto de cegar, que ela tem uma espada
a lhe espetar as costelas
e o riso que nos mostra
é uma tênue cortina
lançada sobre os arsenais. Vamos ao campo
e não os vemos ao nosso lado,
no plantio.
Mas ao tempo da colheita
lá estão
e acabam por nos roubar
até o último grão de trigo.
Dizem-nos que de nós emana o poder
mas sempre o temos contra nós.Dizem-nos que é preciso
defender nossos lares
mas se nos rebelamos contra a opressão
é sobre nós que marcham os soldados.
E por temor eu me calo,
por temor aceito a condição
de falso democrata
e rotulo meus gestoscom a palavra liberdade,
procurando, num sorriso,
esconder minha dor
diante de meus superiores.Mas dentro de mim,
com a potência de um milhão de vozes,o coração grita - MENTIRA!
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