quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Sobre o que Zebedeu escreveu


Por Ana Lu  


Este texto está dentro do contexto do que acontece em Itaporanga:



“Na primeira noite eles se aproximam, roubam uma flor de nosso jardim. E não dizemos nada.


Na segunda noite, já não se escondem: pisam nas flores, matam nosso cão, e não dizemos nada.


Até que um dia, o mais frágil, deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz, e conhecendo o nosso medo, arrancam-nos a voz da garganta. E já não dizemos nada“

(Eduardo Alves da Costa, No caminho com Maiakovski) 


No Caminho Com Maiakóvski
          
Eduardo Alves da Costa*
            
Assim como a criança
humildemente afaga
a imagem do herói,

assim me aproximo de ti, Maiakóvski.

Não importa o que me possa acontecer

por andar ombro a ombro

com um poeta soviético.
Lendo teus versos,
aprendi a ter coragem.

  
Tu sabes,

conheces melhor do que eu
a velha história.
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na Segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.

Nos dias que correm

a ninguém é dado

repousar a cabeça

alheia ao terror.

Os humildes baixam a cerviz;

e nós, que não temos pacto algum

com os senhores do mundo,

por temor nos calamos.

No silêncio de meu quarto

a ousadia me afogueia as faces

e eu fantasio um levante;

mas amanhã,

diante do juiz,

talvez meus lábios

calem a verdade

como um foco de germes

capaz de me destruir.
Eduardo Alves da Costa

Olho ao redor
e o que vejo
e acabo por repetir

são mentiras.

Mal sabe a criança dizer mãe

e a propaganda lhe destrói a consciência.

A mim, quase me arrasta

pela gola do paletó
à porta do templo
e me pedem que aguarde

até que a Democracia

se digne a aparecer no balcão.

Mas eu sei,

porque não estou amedrontado

a ponto de cegar, que ela tem uma espada

a lhe espetar as costelas

e o riso que nos mostra

é uma tênue cortina
lançada sobre os arsenais.        
   
Vamos ao campo

e não os vemos ao nosso lado,

no plantio.

Mas ao tempo da colheita

lá estão

e acabam por nos roubar

até o último grão de trigo.

Dizem-nos que de nós emana o poder
mas sempre o temos contra nós.
Dizem-nos que é preciso

defender nossos lares

mas se nos rebelamos contra a opressão

é sobre nós que marcham os soldados.

          
E por temor eu me calo,

por temor aceito a condição

de falso democrata
e rotulo meus gestos
com a palavra liberdade,

procurando, num sorriso,

esconder minha dor
diante de meus superiores.
Mas dentro de mim,
com a potência de um milhão de vozes,
o coração grita - MENTIRA!

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